quarta-feira, 31 de janeiro de 2007

cadê meu rubro?

odeio os dias de cor cinza como hoje.
gosto de quando acordo e tem
um sol
enorme amarelo vermelho bonito lá fora,
fingindo que é feliz.






gosto do simulacro.



odeio o cinza.

sábado, 27 de janeiro de 2007

Da água

Era doce acreditar que preferir os cachorros poderia ser uma frase bonita na mesa, mas na verdade todo mundo tava muito só.
Todo mundo tava muito só.
Havia meia-luz, conhaque, cigarros, café frio, o barulho baixo da tevê e da respiração.
Ela chorava num silêncio tão profundo, tão centrado, que ninguém percebeu...
Pudera! Não haviam sombras nas paredes ou pés sobre o sofá.
Seus amigos eram muito sensíveis. Quando não, sabiam o resultado do jogo de futebol e poderia a noite acabar com pizzas baratas e vódka ruim.
Quando todo mundo precisava, todo mundo ia, era uma pose só para a foto.
Malditas poses, dizia baixinho, imperceptívelmente.
Quero amigos. Quero quem me ame, quem cozinhe, quem acabe com essa meia-luz.
Algum deles poderia abrir as janelas, deve estar sol lá fora.
Tem aquele restaurante e tem o telefone.
Eles deveriam desconfiar que existem no mundo, além de seus próprios umbigos, os meus.
Se fosse assim, seria menos vazio acreditar naquela euforia toda.
Falando como se alguém acreditasse na euforia.
Euforia é resultado da equação básica infelicidade + desespero.
Eu não devia dizer, mas esta lua, mas este conhaque, botam a gente comovido como o diabo...

segunda-feira, 22 de janeiro de 2007

Ela escrevia, eu Lígia

Era um daqueles dias em que a gente não sabia dizer nada que não 'Adeus'.
Lígia, uma de minhas mulheres, olhava a paisagem atentamente de forma a não perder nada. Estavamos no centro, em uma pracinha cinza com pombos e velhos com histórias tristes e mau cheiro.
Ela carregava consigo um bloco de papél e um lápis de ponta já um pouco gasta. O que Lígia observava na paisagem eu observava em Lígia, minha paisagem.
Suas coxas roliças, gordas, seu porte robusto facilmente notável sob o vestido leve, sua pose de gênio e seu olhar de mar.
Ela queria escrever.
Me disse: "Quero voltar a escrever!".
Nesta noite, eu a tinha levado para jantar em um restaurante grego. Comemos camarões ao Molho de Iogurte e hortelã e pão à moda de Corinto, acompanhados de um vinho leve.
Lígia adora quando falo assim, com savoir faire, dizendo que o vinho em questão é "leve". Ela se encanta com pequenas coisas. Flores, restaurantes, lugares que nunca foi...
É uma mulher fascinante!
Escreveu um livro. Nunca opinei verdadeiramente sobre o tal... Só disse alguns "É ótimo!" embalados pela obrigação de agradar a fêmea, que ela entendeu que foi obrigação e provavelmente imagina que odiei seus papéis... Não.
Lígia escreve a tocar o profundo íntimo de quem lê. Confessando bem, tenho medo de envolver-me com o que escreve Lígia. É intenso, amargo, forte, dolorido...
Quando a conheci, conheci uma mestra na arte da solidão. Aos poucos fomos nos envolvendo. Levei-a onde nunca havia ido. Amei-a como jamais havia sido amada. Lygia era quase-virgem. Não gostava de sexo, não gostava de homens, não gostava de nada.
Vivia entocada em seu quarto de pensão, estudava, bebia vinhos baratos, assistia filmes desconhecidos, lia, ia até o parque com seu bloco de papél, escrevia, voltava. Eu a amei, dei a ela um apartamento aconchegante, noites agitadas, comidas e bebidas desconhecidas.
Parecia perfeito. Ela gostava, achava perfeito. Me dizia ser perfeito.
Ontem me disse que me ama.
Eu sorrí. Sei que também a amo. Amo muito minha Lígia.
Ela sente falta de escrever, sente muita falta de seus dias vazios, mas me ama, ama o vinho leve, a comida diferente, ama meu mundo, o mundo que criei para ela.
A trouxe de carro para o parque.
Há pouco fui perguntar como estava.
Ela disse "tonta".
Eu sei disso.
Me divirto com Lígia...
Não percebeu ainda que jamais conseguirá escrever novamente, afinal, acredita que está feliz.
Estúpida.

quinta-feira, 11 de janeiro de 2007

toilette de fêmeas

Terça-feira, Março 28, 2006
Histórias pra boiada dormir

Dominique não tinha uma família respeitada. A mãe havia morrido atropelada, o pai era um escritor de teatro falido & frustrado & bêbado. Para todos efeitos, era uma boa moça e uma moça boa. Apanhada, dentro dos limites da sua estética suburbana. Todos diziam que seu corpo pertencia aos errantes e a quem não tivesse mais nada, mas este implacável costume do diz-que-me-diz do pessoal do bairro dava-se ao generoso hábito de Dominique de desde menina doar com gosto a quem quisesse doar, mas era limitado a desprezar a essência bucólica e doce da bela moçoila.

À chegada do auge do florescer de sua juventude Dominique, em época de freqüentar o baile do carnaval, conheceu Geruza. Geruza, a amiga de colégio, era a filha do casal modelo de moral e bons costumes do detrito social que as rodeava. Moça pudica e bem criada e muito mais coberta de panos que Dominique que vivia com suas tenras coxas displicentemente à mostra. Possuía olhar casto, trejeitos angelicais de quem foi cria para ser elogiada, declarado sonho - seu, de sua mãe, tia e avô - de casar-se de véu branco.

Certa feita no colégio, Geruza insinuou o quão importante seria para ela, como uma prova de sua amizade, que Dominique a convidasse a dormir em sua casa. Dominique, que sabia bem de sua fama e do conservadorismo dos progenitores de Geruza, ficou receosa, mas não demorou muito a ir falar com os pais da moça. Com os pés muito atrás (todos os dois) e depois de duas horas a fio de sofismas e dialética que Dominique dominava bem, a mãe de Geruza permitiu que a filha saísse com a outra desde que preservando infinitas condições, entre elas que a moça não mais viesse com a sandice de acompanhar Dominique no baile de carnaval naquele ano: "Onde já se viu? Moça de família, nessa idade, na rua?". Geruza não ligou para a condição, não gostava do carnaval, e aceitou cabisbaixa todo o demorado sermão, depois sendo consolada por Dominique que argumentava que pais são adultos e os adultos adultecidos são animais mamíferos, bípedes e bimanos com racionalidade muito aflorada e grande facilidade para aprender a levantar o dedo indicativo em riste e balançar a cabeça negativamente, que isso passa, que é só "pegar confiança".

Foi assim e foi rápido. Dominique estranhava o apreço exacerbado de sua amiga e a necessidade que ela sentia em freqüentar a intimidade de seu quarto, mas justificou para si mesma que talvez fosse a lasca de independência à qual a pobre Geruza reprimida se agarrava, a admiração na amiga livre.

No ano seguinte Geruza não pôde ainda ir ao baile de carnaval, mas não tinha este propósito: Dormiria como em todo final de semana na casa de Dominique, lance de praxe, estranhamente a aprazia mais que qualquer baile... Este ano, Dominique, quem não desperdiçava sua juventude, encontraria por lá um atleta de pouco cérebro e muito músculo, virilidade e voracidade: Nestor fantasiado de búlgaro, e logo depois encontraria com Geruza em sua casa. Quase tudo saindo como programado, se não fosse o imenso bolo que a mal fadada rapariga levou de Nestor fantasiado de búlgaro, que decidiu ficar pelo drive-in mesmo, acompanhado da dançarina havaiana. Mesmo furiosa com o desdém do acéfalo, Dominique não foi para o salão agarrar o primeiro pirata ou marinheiro que encontrasse, pelo contrário, contrariada com o imprevisto decidiu voltar para casa antes mesmo do horário de virar abóbora.

Entrou sem fazer barulho: Era costume que Geruza já estivesse dormindo, dorme cedo, comportada... Nas pontas nos pés subiu as escadas e entrou em seu quarto, mas para sua surpresa, a cama onde Geruza dormia estava arrumada-porém-sem-ninguém. Desceu as escadas curiosa e confusa, tentando entender o destino de sua casta amiga. Ouviu um barulho próximo à porta da cozinha... Alfredo, o gato, queria comida. Pacientemente decidiu alimentar o gato, tomar um copo de leite e ir dormir - aquela noite havia sido um fracasso -, mas quando foi em direção do armário onde era guardada a comida do bichano, um susto: Geruza nua sobre a pia da cozinha, com um chicote açoitando seu pai escritor de teatro falido & frustrado & bêbado que vestia uma ridícula roupa de couro sintético. Assustados e sem ação, os dois enrubesceram e embaraçaram-se completamente, mas Dominique saiu da cozinha de modo que não deixasse tempo para que eles tentassem o fiasco de explicar a cena. Decidida, voltou ao salão e deu para o palhaço, para o faraó, para o escocês, para o homem das cavernas e até para a nêga maluca.

Nunca mais ninguém viu Dominique por aí, uns dizem que ela saiu de mochila pela América do Sul pouco tempo depois, e que morreu há dois anos de velhice antecipada... Pode ser tudo boato, claro. De concreto só o que posso dizer é que no fatídico dia em que Dominique voltou ao baile escreveu com um batom bem carmim no espelho do banheiro feminino: "A vida deve ser muito mais do que uma coleção de momentos. É a coisa de fazer valer cada segundo de sua insignificante existência, pois no inferno não existe Serviço de Atendimento ao Cliente!...”, E depois sumiu no mundo.

quinta-feira, 4 de janeiro de 2007

la mer..


Eu encontrei-(lo) quando não quis
Mais procurar o meu amor
E quanto levou foi pra eu merecer
Antes de um mês eu já não sei
E até quem me vê, lendo jornal
Na fila do pão sabe que eu te encontrei
E ninguem dirá
Que é tarde demais
Que é tao diferente assim
O nosso amor
A gente é quem sabe pequena
E se o caso for de ir a praia...
Eu levo essa casa numa sacola!
Eu encontrei-a e quis duvidar
Tanto clichê
Deve não ser
Voce me falou
Pra eu não me preocupar
Ter fé e ver coragem no amor
Ah vai!
Me diz o que é o sufoco
Que eu te mostro alguém
A fim de te acompanhar!
E só de te ver
Eu penso em trocar
A minha tv num jeito de te levar
A qualquer lugar que você queira
E ir onde o vento for
E pra nós dois
Sair de casa já é
Se aventurar
Ah vai! me diz o que é o sossego que eu te mostro alguém
Afim de te acompanhar
E se o tempo for te levar eu sigo essa hora
Pego carona
Pra te acompanhar